Blog do Alessandro Andrade. Magrinho, Engenheiro e toca violão.

O dia em que fui expulso por saber tocar um acorde

Bem, se você não me conhece e todas as referências neste blog relacionados à violão e outros instrumentos musicais não foram suficientes, saiba agora que eu gosto de tocar violão e outras coisas. Toco desde os 16 anos, quando ganhei meu primeiro violão de Natal do meu pai. Ainda tenho este violão comigo, ele me traz boas lembranças.

Mas dentre várias histórias relacionadas a tocar instrumentos, uma delas me chama atenção até hoje pelo aspecto inacreditável de seu rumo. Resolvi registrá-la aqui e compartilhar com o mundo para, talvez, encontrar algum sentido na mesma.

Pois bem, eu estava no 3º ano do ensino médio e estudava em um colégio particular de Brasília/DF. Fazia pouco tempo que eu tocava violão e nessa época eu e um amigo meu estávamos empolgados com um determinado estilo musical, sobre o qual já falei em outra postagem: o Rock.

Meu amigo estava interessado em comprar uma guitarra e fez um trato bastante justo comigo. Seu pai prometeu lhe dar uma guitarra, mas ele não sabia tocar ainda. Eu ajudaria meu amigo a aprender a tocar e com isso, teria oportunidade de pegar a guitarra emprestada durante alguns dias. Eu nunca tinha tocado uma guitarra, então achei a proposta bastante atrativa.

Tendo planejado essa parte, partimos para encontrar alguém que quisesse vender uma guitarra usada. Descobrimos por um amigo de outra turma que um garoto do colégio estava vendendo uma guitarra e que era só marcar um dia para ir até a casa dele, avaliar o instrumento e negociar a transação. Como eu fui escalado como “professor de guitarra”, aparentemente também era o mais gabaritado para conferir o instrumento, apesar de nunca antes ter colocado minha mão em uma, diga-se de passagem.

Encontrei com o garoto na hora do intervalo, que era mais novo e de umas duas séries antes da minha, e acertei com ele um horário no período da tarde para ver a guitarra na casa dele. Eu estava muito ansioso e resolvi convidar um amigo da minha turma, que morava perto da minha casa, para ir junto comigo até a casa do vendedor da guitarra. Apesar da casa do garoto não ser tão perto, resolvemos ir a pé para conversarmos um assunto que até hoje não foi completamente esclarecido: o que as garotas realmente querem.

Chegando no prédio do jovem – sem uma conclusão no assunto da conversa – interfonamos no apartamento dele, que atendeu e nos convidou a subir. Pegamos o elevador, tocamos a campainha e o garoto nos atendeu de forma solícita, ainda vestindo o uniforme do colégio. Feitas as devidas apresentações, ele nos levou até o seu quarto, onde estava a desejada guitarra.

A guitarra parecia ótima. Ele só explicou que em um dos cantos dela estava faltando uma lasquinha do tamanho de uma unha, mas foi só porque uma vez ele bateu ela contra a parede. Nada demais. Coisa normal para quem tocava rock. O restante da integridade da guitarra parecia intacta.

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Enquanto olhava a guitarra, começamos a conversar sobre música, sobre instrumentos e aí ele começou a dizer empolgado que não via a hora de concluir os estudos no colégio, pois o pai dele havia prometido enviá-lo para os Estados Unidos exclusivamente para estudar guitarra em um instituto muito conhecido (pelo menos ele garantiu isso com tanta convicção que acabou me convencendo). Foi aí que ele disse uma frase que foi a deixa para dar uma reviravolta nessa história, até então pacata:

– Aí você vai ver cara! Vou aprender até a tocar uma DIMINUTA!

No que eu, sem ver problema algum nisso, peguei a guitarra do meu recém apresentado anfitrião e respondi da seguinte maneira:

– Diminuta? DESSE JEITO?

Desferindo o seguinte acorde no instrumento:

Nesse momento, visivelmente tocado pelo som de suspense do acorde, o garoto gaguejou tentando terminar o que estava falando, arregalou os olhos em direção aos meus dedos, abriu a boca e olhou nos meus olhos, depois meus dedos novamente, depois meus olhos novamente e proferiu aquelas quatro palavras que motivaram eu escrever todo este texto anos depois:

– SAI DA MINHA CASA.

Eu e meu amigo – que não entendia nada de música e entrou na história de gaiato no navio – nos entre-olhamos, sem nem sequer nos darmos conta se leva hífen ou não, tentando entender o que tinha acontecido. Olhamos os dois para o garoto, que começava a exibir uma veia saltando da testa, que só repetiu novamente “SAI DA MINHA CASA AGORA”, desta vez apontando a porta, caso não tivesse sido claro o bastante.

Soltei a guitarra do cara, ATÔNITO, caminhei em direção à porta juntamente com meu colega, ainda sem entender nada, ouvindo posteriormente apenas o estrondo da madeira atrás de nós, seguida do som de duas voltas de chave. Chamamos o elevador enquanto eu tentava refazer a cena mentalmente para tentar identificar o momento em que proferi tamanha ofensa e desonra que não pudesse ser suportada sem reação pelo garoto ou por sua família.

Voltamos pra casa com um misto de revolta e risos. Contei a história para meu colega comprador da guitarra, que caiu na gargalhada. Depois disso, ele entrou em contato com o garoto e acabou comprando a guitarra mesmo.

Ensinei algumas músicas para meu colega. Experimentei a guitarra. Nossa banda nunca aconteceu. Mas o mistério do acorde diminuto permanece até hoje.

getoutofhere

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1 Comment

  1. Guitarra Online

    Boa história e de certa forma engraçado! rsrsrs

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